quinta-feira, 7 de julho de 2011

MPF não deve se intrometer em contrato de advogado

Fonte: Site Consultor Jurídico

Foi julgada improcedente a Ação Civil Pública ajuizada pelo Ministério
Público Federal contra 10 advogados de Jales por suposta cobrança
abusiva de honorários em ações previdenciárias que tramitam na Justiça
Federal daquela localidade.
Na sentença, a juíza federal substituta, Karina Lizie Holler, afirma
que "não compete ao Ministério Público Federal imiscuir-se nas
relações contratuais entabuladas entre o causídico e seu cliente. A
pretendida ingerência no conteúdo dos contratos de prestação de
serviço representam séria ofensa ao princípio da autonomia da vontade,
não havendo amparo legal para que se impeça a população de contratar
profissional suspeito de abusos, para se limitar o conteúdo da avença
ou ainda para se impedir o cumprimento de cláusulas contratuais
previamente acordadas".
Na decisão, a juíza também ressalta que a Ação Civil Pública conflita
com a Lei Orgânica do Ministério Público, que só admite a defesa
coletiva por parte do órgão de causas que visem proteger os interesses
difusos, coletivos e individuais indisponíveis e homogêneos: "Como o
texto de lei demanda a mesma origem da lesão para que reste
caracterizada a existência de direito individual homogêneo, a presença
de vários legitimados passivos fulmina de pronto tal exigência. Demais
disso, os interesses envolvidos possuem cunho eminente patrimonial, ou
seja, são disponíveis", ressalta a julgadora.
A questão dos honorários em Jales virou um conflito entre a diretoria
da OAB local e o procurador federal em Jales, Thiago Lacerda Nobre ,
quando este exigiu que a Subsecção quebrasse o sigilo dos processos
éticos da subseção e que informasse nome e tema tratado em reunião de
advogados ocorrida na sede da OAB local.
A subsecção da OAB de Jales negou os pedidos e encaminhou
representação contra o procurador à Corregedoria Geral do Ministério
Público Federal, por entender que seus atos ultrapassavam os limites
de suas atribuições, já que tentava intervir na autonomia da Ordem,
inclusive deliberar sobre honorários advocatícios.
O procurador da república requisitou a instauração de processo crime
junto à Delegacia da Polícia Federal em Jales, para apurar crime de
calúnia, em razão de reportagem jornalística, na qual o conselheiro
seccional local reclamava de seu comportamento, quando requisitou da
OAB informações contidas em livros oficiais da instituição.
Em razão desses episódios considerados violações às prerrogativas
profissionais, o Conselho Seccional da OAB SP aprovou, por
unanimidade, fazer sessão de desagravo para a diretoria da subseção da
Ordem de Jales e para o conselheiro Carlos Alberto Expedito de Britto
Neto. O desagravo foi feito em em 10 de março desse ano, na Câmara
Municipal de Jales. Com informações da Assessoria de Imprensa da OAB.
Leia a sentença:
Autos com (Conclusão) ao Juiz em 04/07/2011 p/ Sentença
Sentença/Despacho/Decisão/Ato OrdinátorioTipo : C - Sem
mérito/Extingue o processo sem julgamento de mérito
Livro : 1 Reg.: 1266/2011 Folha(s) : 2363
Trata-se de ação civil pública, com pedido de liminar, proposta pelo
Ministério Público Federal em face de José Luiz Penariol, Rubens
Pelarim Garcia, Renato Matos Garcia, André Luiz Galan Madalena, Ana
Regina Rossi Martins Moreira, Ari Dalton Martins Moreira Júnior,
Thiago Coelho, Vagner Alexandre Corrêa, João Silveira Neto e Rubens
Marangão, qualificados nos autos, visando à tutela de interesses
difusos e coletivos.
Esclarece o autor que a presente ação está calcada no procedimento
administrativo nº 1.34.030.000002/2010-98, anexado aos autos,
devidamente instaurado no âmbito da Procuradoria da República
localizada na cidade de Jales/SP, a fim de apurar as cobranças
exorbitantes de honorários advocatícios em demandas previdenciárias e,
também, a assídua apropriação dos valores relativos às parcelas
retroativas pertencentes aos beneficiários. Segundo consta, os réus
firmavam contratos de honorários advocatícios com clientes de
baixíssimo grau de instrução e poder aquisitivo impondo-lhes o
pagamento de valores superiores a 30% do valor total advindo da ação,
mais quantias superiores a 30% dos atrasados e honorários de
sucumbência.
Além disso, como forma de ludibriar tais clientes, os réus
peticionavam nos autos dos processos requerendo o destaque das
aludidas verbas honorárias. Fundamenta a ação no defeito do negócio
jurídico celebrado, no Código de Ética e Disciplina da OAB, no
princípio da boa-fé e nos danos causados à imagem do Poder Judiciário,
especialmente à Justiça Federal de Jales/SP.
Como pedidos liminares, o MPF requer "a) declaração de abusividade das
cláusulas contratuais que fixam honorários acima do previsto pela
Ordem dos Advogados do Brasil do Estado de São Paulo;
b) decretar a suspensão da eficácia das cláusulas dos contratos de
honorários formados pelos demandados que prevejam remuneração superior
a 30% (trinta por cento) do valor da condenação, incluídos os
honorários de sucumbência, determinando, por ora, a limitação dos
valores contratados para 30% (trinta por cento) do valor da condenação
(incluído o valor dos honorários sucumbenciais), sem prejuízo de maior
limitação por decisão futura, em fase de cognição exauriente;
c) decretar a suspensão da eficácia das cláusulas dos contratos de
honorários firmados pelos réus que prevejam a compensação ou o
desconto da remuneração diretamente por eles;
d) decretar a suspensão da eficácia dos poderes de receber e dar
quitação, constantes das procurações celebradas em favor dos réus;
e) determinar que os réus sejam impedidos de levantar diretamente
quaisquer valores devidos aos autores das ações previdenciárias ou a
título de honorários advocatícios contratuais;
f) determinar ao INSS e à Caixa Econômica Federal que não efetuem o
pagamento de valores decorrentes de condenação ou acordo judicial
diretamente aos réus;
g) determinar a obrigação de não-fazer consistente em não celebrar
novos contratos com cobrança excessiva de honorários advocatícios,
restringindo-os ao patamar máximo de 30% (trinta por cento) do valor
da condenação, já incluídos os honorários sucumbenciais;
h) impor multa de, no mínimo, R$ 5.000,00 (cinco mil reais) para cada
hipótese individual de descumprimento da decisão exarada por Vossa
Excelência, sem prejuízo de outra cominação diária que posse ser,
criteriosamente, imposta ao demandado". Ao final, pugna pela
procedência da ação. É a síntese do necessário. Decido.Como se vê dos
termos da petição inicial, pretende o MPF conter a abusividade dos
advogados que figuram no pólo passivo da demanda em ações
previdenciárias. Segundo relata a parte autora, citados profissionais
têm exigido de seus clientes honorários contratuais em percentual
muito superior ao teto previsto pela Ordem dos Advogados do Brasil do
Estado de São Paulo, além de apropriarem-se de numerário pertencente
aos segurados que logram êxito em suas demandas no âmbito da Justiça
Federal. Defende o parquet sua legitimidade no fato de serem as
pessoas lesadas idosos, pobres e deficientes, de modo que a mácula a
seus direitos caracteriza ofensa a interesses individuais homogêneos,
que não deixam de ser também interesses coletivos.
Sem razão o Ministério Público Federal. A Lei nº 8.078/91, um dos
diplomas legais que apresenta balizas ao microssistema de tutela dos
direitos difusos, coletivos e individuais homogêneos, positiva as
diferenças na natureza de cada uma da citadas categorias, a saber:Art.
81.
A defesa dos interesses e direitos dos consumidores e das vítimas
poderá ser exercida em juízo individualmente, ou a título
coletivo.Parágrafo único. A defesa coletiva será exercida quando se
tratar de: I - interesses ou direitos difusos, assim entendidos, para
efeitos deste código, os transindividuais, de natureza indivisível, de
que sejam titulares pessoas indeterminadas e ligadas por
circunstâncias de fato;
II - interesses ou direitos coletivos, assim entendidos, para efeitos
deste código, os transindividuais, de natureza indivisível de que seja
titular grupo, categoria ou classe de pessoas ligadas entre si ou com
a parte contrária por uma relação jurídica base;
III - interesses ou direitos individuais homogêneos, assim entendidos
os decorrentes de origem comum. Não restam dúvidas de que o Ministério
Público Federal, na condição de instituição defensora da ordem
jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais
indisponíveis (art.127 da Constituição Federal), detém legitimidade
para promover ação civil pública para a proteção dos interesses
difusos e coletivos, tais como o patrimônio público e social e o meio
ambiente. A própria Lei Orgânica Nacional do Ministério Público afasta
a atuação do órgão em causas de natureza individual e disponível, ao
estabelecer que: Art. 25. Além das funções previstas nas Constituições
Federal e Estadual, na Lei Orgânica e em outras leis, incumbe, ainda,
ao Ministério Público:[...]
IV - promover o inquérito civil e a ação civil pública, na forma da
lei:a) para a proteção, prevenção e reparação dos danos causados ao
meio ambiente, ao consumidor, aos bens e direitos de valor artístico,
estético, histórico, turístico e paisagístico, e a outros interesses
difusos, coletivos e individuais indisponíveis e homogêneos;No caso
concreto os direitos cuja tutela se pretende certamente não são
difusos, nem coletivos. Pertencem a pequeno número de pessoas,
determinadas ou determináveis. Sequer é possível o reconhecimento da
presença de direitos individuais homogêneos, pois são vários os
acusados das práticas abusivas.
Como o texto de lei demanda a mesma origem da lesão para que reste
caracterizada a existência de direito individual homogêneo, a presença
de vários legitimados passivos fulmina de pronto tal exigência. Demais
disso, os interesses envolvidos possuem cunho eminente patrimonial, ou
seja, são disponíveis. O reconhecimento da ilegitimidade do Ministério
Público em situações análogas à ora descrita encontra amparo na
jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça:EMBARGOS DE DECLARAÇÃO.
AGRAVO INTERNO. RECURSO ESPECIAL. PROCESSO CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA.
CONCURSO PÚBLICO. ATO DE ANULAÇÃO.
1. Em essência, a oposição de embargos de declaração almeja
oaprimoramento da prestação jurisdicional, por meio da modificação de
julgado que se apresenta omisso, contraditório, obscuro ou com erro
material (art. 535, do CPC).
2. Reconhecido o erro de premissa do julgado embargado, acolhe-se a
tese do embargante de que a natureza do interesse patrocinado (direito
à nomeação de candidatos em concurso público anulado), é
predominantemente divisível e disponível, fugindo, portanto,
dalegitimidade do Ministério Público para ajuizar ação civil pública.
3.Embargos de declaração acolhidos com efeitos modificativos.( EDcl no
AgRg no REsp 996258 / DF, Ministro CELSO LIMONGI, DJe 21/06/2010)AÇÃO
CIVIL PÚBLICA. PRETENSÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO. DECLARAÇÃO DE NULIDADE
DE CLÁUSULA CONTRATUAL DE ADESÃO PARA AQUISIÇÃO DE IMÓVEL TIDA COMO
ILEGAL. INTERESSES OU DIREITOS COLETIVOS. AUSÊNCIA DE CARACTERIZAÇÃO.
1. A falta de configuração de real interesse coletivo afasta a
legitimidade do Ministério Público para promover ação civil pública
objetivando declarar nulidade de cláusula contratual de adesão para
aquisição de imóvel tida como ilegal. 2. Não sendo divisado direito
coletivo na espécie, carece de legitimidade o Ministério Público para
propor ação civil pública, uma vez que sua atuação não pode ser
confundida com a da Defensoria Pública, mesmo porque, para tal
desiderato, existem vários outros órgãos que o Estado oferece ou
deveria oferecer.
3. Recurso especial provido. Sentença de Primeiro Grau
restabelecida.(RECURSO ESPECIAL - 294759, Rel Min Luis Felipe Salomão,
DJU 09.12.2008,) Cabe por fim ressaltar que não compete ao Ministério
Público Federal imiscuir-se nas relações contratuais entabuladas entre
o causídico e seu cliente. A pretendida ingerência no conteúdo dos
contratos de prestação de serviço representam séria ofensa ao
princípio da autonomia da vontade, não havendo amparo legal para que
se impeça a população de contratar profissional suspeito de abusos,
para se limitar o conteúdo da avença ou ainda para se impedir o
cumprimento de cláusulas contratuais previamente acordadas. Se abusos
existem, toca ao órgão de classe da categoria sua fiscalização,
devendo aquele que se sinta prejudicado levar sua irresignação ao
conhecimento daquela. Ante o exposto, INDEFIRO A PETIÇÃO INICIAL, com
base no artigo 295, inc. II, do CPC. Sem custas judiciais ou
honorários advocatícios (lei nº 7.347/85, art. 18).Publique-se.
Registre-se. Intimem-se. Transitada em julgado, arquivem-se. Jales, 04
de julho de 2011. Karina Lizie HollerJuíza Federal Substituta

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