segunda-feira, 13 de julho de 2009

Não existe justiça. Existe, sim, vingança

Escrito por Carlos Kuntzel
06-Jul-2009
Não gostaria de discutir mais uma vez, nem lamentar o fim da obrigatoriedade do diploma de Jornalismo. Quero falar das incoerências dos mandatários do País, para que haja uma reflexão sobre os últimos acontecimentos, por uma outra ótica.
Vi muitos colegas “jornalistas” comemorando a queda do diploma. Posso garantir que estas pessoas se sentiram vingadas de alguma forma. A decisão teve um gostinho de prazer, considerando que quase todos os que aplaudiram o “ministro” já tiveram problemas com o exercício legal da profissão. Vários foram obrigados a sentar numa cadeira universitária e cumprir a carga horária para que tivessem o direito ao exercício. Hoje são formados, mas sofreram com isso.
São estes também que dizem que a universidade não fez diferença alguma para a vida profissional deles, mas é perceptível que seus textos são “tendenciosos”, que não prestaram atenção aos ensinamentos da academia e não deixaram de escrever artigos de opinião. Isso não é ser jornalista, mas sim colunista ou articulista, que nunca teve a obrigatoriedade da apresentação de diploma.
O maior orgulho destes colegas, que aplaudem o fim do diploma, está na qualidade dos seus textos. Certo. Não há o que negar, porém, para ser jornalista, o texto é a ferramenta primária do exercício da profissão. O que o profissional do jornalismo deve ter, além de um bom texto, são os conhecimentos das teorias da comunicação, das técnicas de radiojornalismo, de telejornalismo, de planejamento gráfico, do fotojornalismo, do jornalismo on-line e da assessoria de imprensa. São áreas específicas que só são possíveis para profissionais práticos (formados pela vida), depois de oportunidades conquistadas para o exercício do aprendizado. Pode até ser possível, mas num mundo globalizado, com a evolução quase instantânea, não há mais espaço para esse tipo de atividade. Também não há mais espaço para profissionais que se limitam a uma especialidade. O mundo é para generalistas, e é isso que a profissional de jornalismo é.
A incoerência da decisão equivocada começa dentro do próprio Órgão que lhe deu a sentença. Aquela instituição da justiça, assim como todas as outras (me recuso a dizer nome ou siglas) tem investimentos significativos na comunicação. Hoje tem rádio, tv, on line, impresso e faz atendimento à imprensa ininterruptamente. Faz concurso para jornalistas diplomados oferecendo ótimos salários. Por consequência da decisão, existem quatro caminhos possíveis: primeiro, manter a obrigatoriedade do diploma para a contratação de jornalistas; segundo, fechar todo o serviço de comunicação (algo que já não cabe mais hoje); terceiro, contratar médicos, advogados, cozinheiros ou qualquer outro profissional para fazer o serviço, caso passem no concurso; e por último exigir que colegas jornalistas formados, que atuam hoje nestes serviços de comunicação, ensinem o ofício aos “jornalistas pára-quedas” concursados.
É lógico que é possível contratar. O que gostaria de saber é se haverá alguém capaz de manter a estrutura funcionando ou se irão investir em treinamentos específicos para a área. Isso nem precisa ser discutido, deixo para você a solução do emaranhado.
Com a revolução industrial surgiram cursos de qualificação profissional para todas as áreas, exatamente para atender a demanda e garantir o desenvolvimento do capitalismo. A imprensa foi o primeiro instrumento viável para levar conhecimento aos mais distantes lugares deste país e ainda hoje é assim. São 70 anos de história acadêmica e 40 anos de conquistas profissionais. Tudo para garantir que a informação chegue de forma isenta, ética e moral do outro lado. Um jornalista tem valores que lhe são amplamente ensinados na academia, que fazem dele um cidadão crítico e com responsabilidade social.
É claro e evidente que este poder alcançado pela imprensa, considerado até como o quarto poder, é o órgão fiscalizador mais eficiente em benefício da cidadania. Nessa discussão não estão inseridas as classes patronais que moveram a ação que deu fim ao diploma, pois é fato que o interesse da classe patronal sempre tem preço e, pelo que me parece, todos os mandatários também o tem. Se não fosse assim, talvez realmente existisse justiça, e não apenas vingança.
(*) O autor é jornalista formado e Professor Universitário
Publicado originalmente no jornal A Crítica de Campo Grande-MS

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